quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Mãe Médica

(...)
Enquanto tomava banho me vieram estes pensamentos que são reais, dividi com a minha irmã Jéssica Mondlane e agora vou dividir com vocês !



'' Eu tinha apenas 5 anos quando aos poucos fui criando a paixão pela Medicina, cresci numa família sem médicos e num país onde 1 médico está para 10.000 doentes (pois triste realidade) ' acabei o secundário e não via a hora de finalmente realizar o grande sonho que desde pequena carregava comigo. Entrei na melhor universidade da minha cidade e fiz a Medicina cheia de garra e determinação, me fechei para o mundo e foquei-me apenas na Medicina, afastei-me dos meus amigos e de tudo que eu gostava e criei um novo mundo para mim, onde só existia eu e a minha sede pela profissão. Terminei o curso com sucesso e quando olhei para os lados tinha apenas os meus pais orgulhosos, os livros e uma mente rica em ensinamentos mas olhei para trás e vi o reflexo de uma mulher que ainda ontem tinha apenas 5 anos, sozinha sem amigos e com uma vida preto e branco. O tempo se passou e lá estava eu dando consultas e com novos sonhos, fazer a minha especialidade. A verdade é que a minha ambição pela Medicina era tanta que engravidei de um homem que eu nem amava, logo eu, que, sempre sonhei com um príncipe encantado, daí a falta de amor e compreensão acabou com a relação e lá estava eu de novo sozinha, mas desta vez com um filho na barriga. Os meses se passaram, o meu menino nasceu prematuro, pois eu não repousava e passava noites em claro lendo livros sobre Medicina para destacar-me sempre no meu sector profissional. O meu filho foi crescendo recebendo de mim apenas um beijinho de bom dia e um de boa noite, ele já está com um ano de idade, ta grande, saudável e lindo como o pai que eu nunca amei. A verdade é que nunca me dei um minuto para ser mãe pois estava preocupada em ser Deus da minha população. O tempo foi passando e o meu filho foi crescendo e finalmente consegui uma bolsa para ir ao exterior e fazer a minha especialidade, o meu filho já estava com 3 anos, fui embora sem pensar duas vezes e o deixei com a minha mãe. Cá estou eu de volta a minha cidade depois de quatro anos, está tudo na mesma cidade, os buracos nas ruas, os lixos acumulados (realmente estou de volta a casa). Vou a casa da minha mãe buscar meu filho que está agora com 7 anos, já é um menino e está na segunda classe, no caminho para lá lembrei-me que não me dei tempo para comprar nem um presentinho para ele (lágrimas), lá vou eu ao shopping mais perto e carrego monte de brinquedos e roupas, embrulhei tudo e fui buscar meu menino. Ele quando me viu nem me reconheceu, a minha mãe teve que dizer : ''Miguel, ali está a tua mãe, já chegou de viagem'' (a pedalada foi tão forte que não consegui conter as lágrimas) e ele deu-me um abraço bem forte de saudades, aí eu disse comprei um monte de presentes, mas no momento nem me dei conta que não estava falar com aquele bebé que eu deixei a 4 anos mas sim com um menino e tudo que comprara jamais o serviria e pela idade dele ele jamais ia brincar com aqueles brinquedos (meus olhos encheram-se de lágrimas), e eu pedi perdão ao meu filho e o prometi ir as compras com ele onde ele ia poder comprar tudo que quisesse, ele mostrou uma cara de desgosto e sem interesse nenhum pelas minhas palavras. Voltamos para casa e dia seguinte tive que fazer umas mudanças em seu quarto ao gosto dele. Chegou a época do Natal e eu disse ao Miguel para escolher o seu presente, e faltando dois dias para o Natal ele escreveu-me uma carta que dizia : '' Querido Pai Natal, peço para falar com Deus em meu nome e pedir desculpas a ele se um dia eu tiver errado. Neste Natal eu não vou mudar o pedido que tenho feito todos estes anos, mas volto a repetir, eu quero que o Pai Natal me ofereça uma mãe de verdade igual a dos meus colegas lá da escola. '' depois de eu ter lido a carta o meu coração parou por 5 segundos, me senti aos pedaços e sem chão. Dia seguinte dei bom dia ao meu filho e nem sequer comentei sobre a carta, e nessa manhã me apercebi que o meu filho nunca me chamara de mãe mas sim de Doutora (baixei a cabeça e fui trabalhar). Chegou o Natal, família reunida e alegria na cara dos meus familiares, o Pai do Miguel ofereceu-lhe uma linda bicicleta e um novo equipamento de futebol porque ele amava jogar a bola (descobri que o pai conhece bem o seu filho melhor que eu), eu ofereci-lhe um computador com jogos já instalados, ele amou, fiquei aliviada por ele ter gostado. Os anos foram passando e nunca comentei sobre a carta que o Miguel me escrevera, diminui as minhas horas de trabalho e já me dava tempo para passear e fazer programas de mãe e filho e assim aos poucos a alegria entrara em minha casa (um sorriso forçado de contenção) . Hoje estou com 45 anos e meu filho acabou o secundário, mas ele nunca falou-me sobre o curso que ia seguir, até que um dia eu o perguntei e ele disse que queria fazer Medicina, para ser médico e finalmente entender a sua mãe. Fiquei tão espantada que os meus pés até tremiam, olhei para ele e disse : '' Eu falhei um dia, não fui suficientemente mãe para ti mas não cometa o mesmo erro que eu e seja um pai completo. A Medicina é um curso de amor, faça-o por gostar e para salvar vidas mas jamais deixe que ela esteja acima da tua própria vida. '' . E com um longo sorriso o Miguel diz: ''Obrigado MÃE'' (era a primeira vez que ele me chamara de mãe), abracei-lhe com tanta força e disse: ''Amo-te FILHO'' (era a primeira vez que eu dizia que amava ao meu filho)

Espero que tenham entendido a mensagem !!



Autora do texto: Muty Mondlane

^.^

1 comentário:

  1. Para quem cresceu com pai e mãe médicos, ler este texto quase que me põe a chorar aos cântaros. As noites (e os anos) passados sem eles em casa para fazer companhia, as viagens de lazer perdidas por causa da responsabilidade, as longas esperas sozinha na escola depois das aulas (que chegaram a ser de +1hra). Desisti de querer ser médica quando me apercebi do quanto a profissão dos meus pais afetou a minha vida, mas a verdade é uma: para bens maiores há sempre sacrifícios imensuráveis.

    ResponderEliminar